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Os 10 Obstáculos Para Uma Vida Espiritualizada

Os 10 Obstáculos Para Uma Vida Espiritualizada

A busca por uma vida espiritualizada parece ser uma necessidade do ser humano há milênios, principalmente quando a vida parece estar sem sentido ou quando tudo parece que está dando errado.   Nessa mesma proporção também parece que o ser humano sempre busca o mais simples, o mais fácil e porque não, o mais rápido, mesmo em se tratando de evolução espiritual.

Nosso whatsapp que o diga, com tantas correntes, mandingas, orações e barganhas espirituais que recebemos constantemente de amigos e parentes.  Mesmo que você afirme categoricamente que tudo é uma grande bobagem, que os espíritos e guias não possuem domínio @ceu.com.br, o originador manda: “ahh.. não faz mal a ninguém, vai que é verdade!”. E lá vamos nós com todo a ilusão e materialismo espiritual buscando o mágico.

O que precisamos entender é que o caminho espiritual é árduo e necessita de aquisição de conhecimento, prática, confiança para que então possamos vislumbrar alguma realização e isso toma tempo, muito tempo, além de foco e disciplina.   Esses itens você só consegue quando investiga seus propósitos e suas intenções, sempre lembrando que o caminho espiritual é seu e não do outro. Tudo começa e termina consigo para quem sabe, você poder ajudar quem precise.  Lembre-se da viagem de avião quando a comissária diz para você “se as máscaras de oxigênio caírem, coloque-a primeiro em você para depois auxiliar quem precisa”. Ela te diz isso por que se você ficar tentando ajudar todo mundo antes de se garantir, você e o resto irão desmaiar, mas se você colocar em si primeiro, vai ter todo o tempo e calma do mundo para dar um help para as pessoas próximas.

Como nem tudo são flores celestiais nesse caminho, no budismo temos uma visão de que temos que sempre observar os obstáculos na nossa jornada e lidar com eles todos os dias em todos os momentos.  A ideia é elimina-los um a um para que nosso voo seja cada vez mais tranquilo, embora longo e sujeito a turbulências.

O primeiro e maior obstáculo de todos é a crença que somos seres individualistas e que nossas ações são estanques e não afetam as pessoas, a natureza e outros seres ao nosso redor.  Ainda achar que temos um ego imutável e permanente.  Essa crença leva ao desenvolvimento da soberba e da arrogância nos colocando em uma posição de falsa superioridade em relação aos outros seres, desenvolvendo o que o Lama Chogyam Trungpa definiu como “materialismo espiritual”. Ou seja, o que deveria te tornar uma pessoa mais humilde e desprendida, faz com que você se transforme justamente no oposto e de forma nefasta.  Quando entendemos que somos partes de uma mesma rede intrínseca de seres e que nossas ações afetam todos o ecossistema no qual vivemos, começamos a falar, pensar e agir de forma mais sábia e compassiva. Entenda definitivamente que você não é uma ilha e nem é o dono ou dona do mundo.

Aí vem a dúvida, o ceticismo para atrapalhar as coisas. Eu acho ótimo alinhar ciência e espiritualidade, embora isso faça com que todo o tipo de teoria absurda apareça com uma roupagem cientifica totalmente falsa e inventada. Mas muitos seres humanos são céticos porque querem que não só essas duas áreas caminhem juntas mas também que se corroborem entre si. Isso não dá muito certo, acredite. Sua Santidade, o Dalai Lama já disse muitas vezes que qualquer coisa que a ciência prove que contradiga os ensinamentos budistas, esse último deveria mudar em prol das descobertas cientificas. Eu concordo cem por cento com isso, afinal, prova é prova. Mas… sempre tem um “mas”… pode-se provar tudo? Talvez não, mas nada impede você de testar os ensinamentos que aprende e verificar se eles são válidos ou não. Um monge japonês chamado Shinran dizia que temos quatro estágios no nosso caminho, a aquisição da sabedoria, ou seja, o estudo; então a prática daquilo que compreendemos; a partir daí desenvolvemos nossa confiança no que aprendemos, aplicamos e vimos que funciona e assim chegamos a nossa realização espiritual.   Sou partidário de que não precisamos de dogmas cegos e inatingíveis, mas uma boa dose de confiança prévia se faz necessária. Mesmo um cientista tem que ter confiança em uma teoria para poder ter o ímpeto de testá-la empiricamente.  Liberte-se de seu ceticismo e de uma chance para o intangível, você vai se sentir muito mais aliviado como ser humano.

Como terceiro ponto temos o apego exacerbado aos rituais que não fazem sentido ou não tem um aspecto prático em nossas vidas.  Isso quer dizer que não podemos achar que participar exclusivamente de rituais vai garantir que sejamos pessoas melhores ou que somente o ritual poderá nos suprir.  Vale lembrar que o ritual tem uma função de recordação, uma função mnemônica para fixar um determinado ensinamento e nos conectar com o sagrado.  Porém, ir a uma missa, ou terreiro, ou templo e achar que isso é o suficiente para nos fazer caminhar é um ledo engano e pode gerar uma ilusão de que há uma magia intrínseca. É certo que muitas denominações religiosas tem a participação no rito como um dogma e outras como um simbolismo, mas no fundo temos que praticar o que aprendemos e desenvolvemos internamente.

O ser humano busca o prazer em tudo que faz e tem aversão a tudo que causa desconforto e tal atitude não é distinta na busca espiritual. É notório vermos o quanto se busca soluções simplistas e imediatas para nossos problemas e inquietações, haja visto a quantidade de “simpatias” e rituais inócuos que a crendice popular desenvolveu nesses séculos de existência.  Então, o apego à essas sensações ou desejos sensoriais terminam atrapalhando e muito nossa jornada pois uma verdadeira caminhada espiritual vai nos mostrar quem realmente somos e muito provavelmente, você não vai gostar do que vai ver. Logo, o desconforto é inevitável e teremos sempre a vontade egóica de fugir desse estado e voltar ao conforto ilusório da realidade do sofrimento. Encare a si próprio com coragem e altivez porque só assim você poderá entender o que é necessário para alterar essa composição mental que você tem hoje e usufruir mais dos ensinamentos adquiridos.

De uma maneira quase óbvia, a raiva e a má intensão aparece como nosso quinto obstáculo, mas não menos importante para nossa prática espiritual.  No budismo, dizemos que existem três venenos mentais agindo constantemente em nós e por isso ficamos presos aos nossos sofrimentos. Junto com a ignorância e a ganância, a raiva se apresenta como o terceiro e implacável corrupção mental que nos previne de uma vida plena.  Prestar atenção na fala correta e no pensamento correto nos ajuda a desenvolver o antidoto necessário para adicionarmos mais compaixão às nossas atitudes determinando uma cura sistemática para as nossas manifestações egóicas que citamos como nosso primeiro obstáculo. A raiva se desenvolve principalmente pela nossa frustração em não sermos considerados únicos e superiores aos demais seres, querendo assim que nossa opinião e atitude prevaleçam e possamos subjugar os demais. Agir de maneira compassiva nos leva a uma nova dimensão de vida e deixamos de agir com a mente maligna para inundar nosso coração de bondade.

Na sequência temos mais dois obstáculos que se complementam, exaltando nosso apego tanto a essa existência mortal como a uma existência eterna e não corpórea.  Isso significa, que temos apego a essa vida e também ao mesmo tempo, vivemos em função de um futuro pós-morte que é totalmente incerto.  Haja visto que então não fazemos uma coisa bem nem a outra. Ou nos apegamos a essa existência corpórea e nos enchemos de pânico da morte ou vivemos em função da morte deixando essa vida em um plano secundário. Tanto uma como a outra são situações nocivas pois tiram o foco de construir um ser humano melhor. Se pensamos somente na nossa existência nesse mundo temos pensamentos e atitudes niilistas que podem fazer com que ajamos egocentricamente causando sofrimento ao outro. Contudo, quando nos apegamos ao fato da uma vida eterna após esta, temos a tendência de deixar tudo para depois, tendo em vista que para quem vive, a morte está sempre distante.  Temos que entender que jamais saberemos quando a morte virá então temos que começar a mudar agora nesse minuto, nessa existência, justamente porque temos a certeza do que vivemos, mas sem deixar de olhar para o futuro pois é lá que colheremos os frutos de nosso presente.

A presunção se apresenta como a oitava barreira a ser transposta. Nosso orgulho faz com que achemos que estamos sempre certos e os outros errados e mais uma vez nos colocamos como seres superiores e dotados de uma opinião imutável.  Tal modo de ver o mundo fecha as portas do conhecimento e da transformação. Quando a soberba nos toma simplesmente nos colocamos como donos da verdade e paramos de ouvir um bom mestre e a olhar com critica nossas atitudes, palavras e pensamentos. Mais uma vez prestar atenção nos outros e se abrir a escutar o mundo é o melhor caminho para tirar esse obstáculo do caminho. A humildade de rever opiniões e conceitos faz com que desenvolvamos uma mente compassiva e sabia. Lembre-se que um bom mestre é aquele que sabe aprender, para então poder ensinar.

Nosso nono obstáculo é a impaciência originária da vontade de resultados rápidos e necessidade de soluções imediatas. É um risco grande achar que poderemos buscar uma transformação da noite para o dia e o exemplo que temos de grandes mestres do passado nos dá o verdadeiro testemunho de que a paciência realmente é uma virtude.  Tudo é gradual e a mudança de nossos hábitos e moldes mentais para nos transformar em seres melhores não é diferente.  Tenha paciência consigo, entendendo que há um grande caminho a se percorrer, mas ele começa com um único passo.

Por fim, a ignorância no sentido de desconhecimento é um veneno mental que freia nossa busca, pois o achar que sabe ou o não saber nos faz enveredar por caminhos estranhos e por vezes, vazios.  Ou mesmo a busca por um conhecimento sem um objetivo claro nos faz perder tempo e nos iludir com resultados ilusórios que na verdade nunca virão.  Busque sempre conhecer as verdades doutrinárias dos caminhos a serem seguidos e valha-se de informação sobre aqueles que você segue e deposita sua confiança. Como disse Shinran, conhecer é o primeiro passo dessa busca, para então praticar.  Entenda que você não consegue fazer um bolo que realmente seja bom se não souber a receita. Você pode até fazer, mas será na base do acerto e erro, contudo, valer-se de alguém que sabe como é, já lhe será útil até para remover a inquietude e a arrogância.

Como vimos, sermos pessoas melhores demanda basicamente o subjugo do egocentrismo e uma visão compassiva e sábia do mundo. Não importando sua crença ou sua religião, lembre-se que são nossas atitudes que formam nosso caráter e faz com que colhamos os frutos em nossas vidas. Apenas crer sem agir é inútil.

Desigualdade de Gênero Como Manifestação da Ignorância

Desigualdade de Gênero Como Manifestação da Ignorância

Convivo há duas décadas com quatro mulheres em casa: três humanas e uma canina, que de certo modo formam uma aliança poderosa na minha vida que me mantém atento às necessidades, conflitos e desafios sociais que elas enfrentam.  Tenho que confessar que há muitos anos eu era um ser machista, pois ainda me faltavam anos de vivencia neste mundo e nessa sociedade para compreender o que uma mulher passa no seu dia-a-dia.  Me faltava sabedoria e também compaixão de certa forma.

Foi quando comecei a estudar o budismo que as coisas começaram a mudar, juntamente com a época do meu casamento e o nascimento da minha primeira filha.  De repente, por necessidade de compreender esse universo, comecei a prestar atenção na sociedade na tentativa de visualizar o que ela reservava tanto para minha jovem esposa como para minha recém-nascida. Confesso que não gostei do que vi e minha percepção de mundo mudou.  Ainda munido de um machismo italiano com vinte e poucos anos, dizia que queria ter dois filhos, a primeira menina e o segundo um menino, já dando nomes aos dois.  Mas no dia que a Giulia veio ao mundo e olhei para ela pela primeira vez, tive a certeza absoluta que eu jamais seria pai de um menino, o que se comprovou quatro anos depois com a chegada da Vittoria.  Assim, mudei, mudei minha atitude e meus pensamentos, passando a olhar o mundo com um olhar defensor da igualdade de gênero. Aliás, essa convivência com minha querida esposa e minhas filhas só reforçaram minha visão budista do mundo, que se baseia numa ilusão egóica de distinção de gênero que só consegue se defendida à luz de um ignorância secular sem igual ou precedentes.

De qualquer maneira eu vibro com as conquistas delas, como vibro com as recentes conquistas de muitas mulheres guerreiras nesse mundo. O que mais me fascina é que estamos cada vez mais descobrindo heroínas da história que dantes não fazíamos ideia que existiam, mas que agora os mais machistas tem que abaixar a cabeça e agradecer.  E foi justamente através das mulheres da minha vida que pude conhecer a história dessas grandes personagens. Fui apresentado pelas minhas filhas à Millicent Fawcett, líder sufragista inglesa que defendeu os direitos das mulheres no século 19 de maneira pacífica, mas contundente. Ou a própria Rainha Vitória do Reino Unido que comandou um império numa tenra idade. A grande escritora Jane Austen que no século 18 desafiou a sociedade escrevendo romances espetaculares, em uma época que a inteligência feminina era tida como inferior (infelizmente ainda é hoje!).  E não menos Malala Yousafzai, que após quase morrer nas mãos do Talibã, defende a causa da educação para as mulheres em todo o mundo.  Dentre tantas outras, eu só tenho a agradecer por tê-las conhecido e hoje respeita-las por tudo que fizeram.

Mas o que podemos fazer para que não tenhamos mais que falar sobre isso como uma conquista? O que podemos fazer para que hashtags #metoo não tenha mais que ser estampadas para que tenhamos uma igualdade definitiva no mundo?

Eu tenho uma sugestão: use sua vontade de aprender mindfulness para começar a reconhecer o poder feminino e a igualdade merecida das mulheres.  Sendo mindfulness uma técnica para se ter atenção plena, eu convido você a começar a pratica-la bem perto de seus afazeres.

Você para exercitar o mindfulness não precisa comprar cursos ou sentar em posição de lótus por horas a fio para buscar algo que nem você sabe o que é.  Ter uma atitude mindfulness é desenvolver a compaixão e a sabedoria com um objetivo único de cessar o sofrimento alheio e acolher as necessidades do outro como sendo a sua.  Esse sentimento é dirigido sempre ao outro e não a você. Não adianta nada você gastar seu tempo sentado meditando se é incapaz de reconhecer o poder feminino e a igualdade de gênero que se apresenta diante dos seus olhos na sua família, no seu trabalho ou mesmo com desconhecidos na rua.  Bater no peito e posar de espiritualizado enquanto faz piadas machistas e distribui postagens preconceituosas com mulheres nas redes sociais, coloca por terra toda a sua tentativa de subjugar sua mente iludida e o torna um ser humano vulgar e hipócrita.

Você se ilude achando que os homens são superiores porque as grandes quebras de paradigma da história foram feitas por mulheres e isso segue até hoje. Se você acha que os homens são superiores em qualquer aspecto é fruto de uma ignorância social e influencia talvez religiosas que demonstra nada mais que pura ilusão de realidade.

Sendo assim, use seu poder crítico para começar a entender que todos somos seres humanos iguais, não importando a forma de nosso corpo, a cor de nossa pele ou as idéias dentro da cabeça.  O seres humanos são iguais e o reconhecimento dessa igualdade só vem quando temos atitudes concretas que combatam a discriminação em todas as esferas sociais.

As mulheres estão lutando com todas as forças para sobreviverem e nós homens temos a obrigação de ajuda-las como elas sempre estão dispostas a nos ajudar. Sem julgamento, se distinção, apenas com respeito e reconhecimento.

E por esse reconhecimento que fico empolgado de ver que dentro do budismo temos grandes expoentes do sexo feminino no mundo contemporâneo que trazem a luz da sabedoria para a humanidade.  Destaco Pema Chodron com sua sensibilidade e carinho para falar sobre a morte. Tenzin Palmo que angariou fundos e praticamente construiu com as próprias mãos um monastério para mulheres em Ladakh para dar empoderamento paras as monjas locais e do mundo todo.  Reva. Junko Obata da Ordem Shinshu Otani que promove um trabalho com leprosos no Japão além de encabeçar uma poderosa associação de monjas da ordem no Japão para garantir sempre direitos iguais. No Brasil, destaco a monja Isshin de Porto Alegre que tem usado a tecnologia para difundir o Dharma em português e a Reva Sayuri Tyojun de Apucarana que tem dedicado seus dias a árduas traduções de textos sagrados do japonês para o português para que tenhamos acesso cada vez mais à uma sabedoria milenar.

Eu me prostro diante desses ícones e as reconheço como marcos históricos que devem ser conhecidos e reconhecidos por todos.  Desta forma, tenho a esperança que possamos deixar de discutir esse assunto em um futuro próximo pois será tão natural esse reconhecimento que não precisaremos mais nos envergonhar de nossas atitudes machistas.

#girlpower